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Próxima estação

Quando não há no Estado, nem nas empresas, pessoas com a competência certa, tem então de se ir procurar, através de concursos exigentes, os melhores. Não é os paus para toda a obra dos partidos.

É motivo de orgulho para todos, mas individualmente falando. Não é colectivamente. Podemos ter orgulho em nós próprios. Cada um. Porquê? Porque podíamos ser presidentes do Metro do Lisboa. É verdade que não percebemos nada de gestão de metropolitanos – enfim, falo por mim e por uma maioria, pois talvez se encontre entre os leitores alguém versado em temas do foro da ferrovia -, mas parece que isso não é requisito para presidir ao Metro de Lisboa. Isto a ver pela escolha que o Governo terá feito, pelo menos.

Cristina Vaz Tomé – que a imprensa diz estar na calha (ou na linha) para o cargo – foi secretária de Estado da Saúde até há pouco tempo. Não correu bem. A ministra – que também não está a correr de feição – retirou-lhe poderes, nomeadamente o INEM. Se considerarmos esta ministra da Saúde incompetente – eu não considero por me faltar informação para chegar a tal conclusão com segurança e afirmá-lo, ainda que suspeite que não é um ás -, então a próxima presidente do Metro não foi apenas incompetente, foi incompetente até para alguém incompetente, o que será o pináculo da incompetência.

Como é que se é bom para gerir a Saúde e, uns meses depois, um metropolitano? É que foi tão depressa que os utentes do Metro, um dia destes, entram na composição e está cheia de macas, porque a nova gestora confundiu-se e encomendou umas centenas. Entre uma coisa e outra, a engenheira Cristina foi deputada. No passado, segundo os currículos que se encontram, foi administradora da RTP e depois esteve na Comissão Executiva do Grupo Impresa (que detém a SIC e o Expresso, entre outros órgãos). É licenciada em Engenharia de Gestão Industrial. Também foi vice-presidente do Instituto de Investigação Científica e Tropical. Nesta fase, estou muito baralhado. Dá para tudo. Nunca jogou pela selecção só porque não calhou.

Nada disto é novo, eu sei. Isto é, aliás, o costume. É só mais uma Bimby, como já vimos tantos e tantas. A questão é que, em cargos de natureza política pura, eu até sou capaz de dar o benefício da dúvida. Há pessoas com competência política ampla, capazes de executar programas em áreas que até não dominavam. Isto não é desejável, mas é possível. Agora… gerir uma empresa e ainda por cima uma empresa destas? O metropolitano de uma capital? Ainda andamos nisto, a distribuir administrações de empresas como se fossem lugares em listas? Temos uma história de péssima gestão, dívidas colossais – que desaparecem por milagre com transferências ora para a autarquia, ora para o Governo, como aconteceu com a Carris -, e continuamos com os mesmos métodos!? É preciso escolher alguém e vamos ver quem é que, no grupo, está de mãos a abanar!?

Neste caso, é o pleno. Não se percebe a escolha para a Saúde. Agora não se percebe para o Metro de Lisboa. Não se percebe, mas tem de se perceber. O Estado tem funcionários altamente competentes e experientes, tem de se recorrer a estes, à prata da casa. Não se pode ir ao centro de emprego do partido. Quando não há no Estado, nem nas empresas, pessoas com a competência certa, então tem de se procurar através de concursos exigentes. Tem de se ir buscar os melhores, não é os paus para toda a obra dos partidos.

A engenheira Cristina pode ser séria, honesta e até pode ter sido muito competente num dos mil ofícios que já desempenhou, mas não percebia um boi de Saúde e agora não perceberá um boi de metropolitanos. É que nem experiência de uso terá. Ora, isto não podia acontecer. Porém, não falha. Há décadas. Depois o populismo cresce, sem surpresa, dez deputados ao ano – num sucesso que muitos inteligentes atribuem ao radicalismo popular, mas eu tenho alguma dificuldade em culpar o povo. Há partidos radicais desde que há eleições e sempre se deu todas as oportunidades ao centro democrático.

Mas não aprendem. O ataque à democracia vem, por isso, de dentro. Quem não está assim tão interessado nela só se aproveita. Os golpes são às claras. Nem é preciso a clandestinidade.

[Crónica publicada originalmente na newsletter Agora a Sério.]

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