Não sei, muito sinceramente, onde é que alguns portugueses foram buscar a ideia de que o Governo quer vender a TAP, pois parece-me evidente que o que o Governo quer é ofertar a TAP. Vender envolve um conceito de negócio que o Governo parece não querer fazer. Estamos mais perante um caso de beneficência. O Governo quer ofertar a TAP a um menino que precise.
Basta ouvir o primeiro-ministro a falar da empresa para ver que não a pode querer vender. Aliás, mais parece que quer comprá-la. Ou trocá-la por uma mota, mas uma lambreta, não pode ser uma Ducati, pois não estamos aqui para enganar ninguém. A verdade é que ele desvaloriza-a tanto que até se está a ver à rasca para a oferecer. As reuniões com os interessados devem ser lindas. São os interessados a tentar dar algum valor à TAP e o Governo a dizer que “não, está na miséria, então esta greve dos pilotos foi um horror e ainda paira a ameaça de mais”.
Depois os interessados devem insistir que mesmo assim deve valer alguma coisa, mas o Governo deve insistir que não, não vale nada. Pais do Amaral, por exemplo, que é um dos interessados, já se deve ter disponibilizado para dar uns dez euros, mas o Governo deve ter-lhe dito para guardar o dinheiro: «Compre antes umas raspadinhas, não vai estar a gastar o seu precioso dinheiro com a TAP. Se alguém tem de dar dez euros aqui a alguém, somos nós ao senhor engenheiro, senhor engenheiro, aliás, tome já aqui dez euros meus, mais dez do ministro da Economia, isso, agora mais dez do senhor secretário de Estado.»
Sobre isto da greve dos pilotos, por exemplo, o primeiro-ministro podia ter dito que todas as grandes companhias têm greves de pilotos, assim para enquadrar um bocado a coisa. A British Airways, a Air France, a Lufthansa… e as greves deles também não são de dois dias. Mas em vez disso, o dono – por incrível que pareça – da TAP preferiu dizer que é claro que esta greve desvalorizou ainda mais a empresa e que a ameaça de mais greves ainda desvaloriza mais. Ó homem, pronto, calma, já chega.
Para as reuniões, os interessados na TAP só têm de levar as declarações do Governo, nem precisam de se preparar. Mas mesmo assim, o Governo lá reconhecerá, durante a reunião, que o cenário ainda é pior, só que não podiam dizer alto porque o povo ficava com pena.
No fim da reunião, se o Governo perceber que está quase a oferecer a TAP, basta o interessado franzir o sobrolho como quem diz “não sei não” e ainda leva o Algarve de oferta: «Pronto, não se fala mais nisso, nós também concordamos que a TAP nem dada, portanto leva aqui também o Algarve, magnífico clima, uma terra lindíssima, pessoas encantadoras, gastronomia de chorar.»
Nesta altura, se o interessado franzir ainda um pouco mais o sobrolho… «Claro que sim, tem toda a razão, podemos oferecer então também o Minho? Um clima diferente, mas um paraíso ibérico no centro da Europa se estiver na parte mais ocidental da nossa plataforma marítima, espere, claro, é isso, ficam também com a plataforma marítima, tem tudo a ver, aviação, navegação, navegação aérea, navegação marítima, plataforma marítima, é vossa, parabéns, estão aqui as chavinhas de tudo, da TAP, do Algarve, do Minho da plataforma marítima.»
Enfim, a verdade é que não se pode dizer que o Governo queira vender a TAP. Isso é de uma enorme injustiça. O Governo parece querer ofertá-la, doá-la, trocá-la ou mesmo abandoná-la. Sim, abandoná-la, porque o Governo nem parece ter coragem de chamar a recolha da câmara. Tudo isto por culpa dos pilotos, claro. Se não fossem eles, a TAP estava de vento em popa a valer para cima de mil milhões de euros.
Há uns meses, o ministro da Economia também ia à televisão dizer que a TAP valia menos que um pratinho de tremoços. Nessa altura, o grande argumento eram os problemas técnicos e os atrasos. Ou seja, a culpa não era dos pilotos, era do mecânico.