Os Jogos Olímpicos terão começado por volta do séc. VIII a.c., na Grécia. Ou seja, há sensivelmente 2800 anos. Foram sofrendo mudanças, a maior talvez seja os Jogos Olímpicos da era moderna. É assim a grande transformação. Ora, com tanta história, dir-se-ia que os jogos estavam aí para ficar, mas suspeito que estejam de partida. Depois da era moderna, dificilmente sobreviverão a esta era uma vez.
A Humanidade descobriu, 2800 anos depois, que a alta competição pode provocar stress, ansiedade e depressão nos atletas. De facto, nunca os vi terminar uma maratona com minis na mala de um carro, como vejo nos runners. Quem conquista medalhas festeja, torna-se herói e dá a volta com a coroa de louros, os outros, derrotados após tanto treino e tanto esforço, em princípio estarão na merda. Faz parte. Até ontem, pelo menos, porque agora parece que é uma crueldade.
Tudo começou com o desabafo da ginasta Simone Biles, por cá tivemos o pedido de desculpas da Auriol Dongmo. Tremendas atletas. Esta última pediu desculpa por não ter conseguido um resultado melhor, razão para alguns questionarem a “pressão” que se coloca em cima dos atletas. Pressão? Claro que há pressão, é uma competição. Se calhar devíamos ter pedido aos nossos atletas para trazerem medalhas ou, em alternativa, uma lembrança do Japão. Vamos todos receber o grande Simplício ao aeroporto, que não chegou às medalhas porque teve saudades dos gatos, mas alcançou uma colecção de origami e duas garrafas de saké no duty free, à vinda.
A pressão existe sempre que se procura o sucesso e a glória, seja em que actividade for, não é apenas nos Jogos Olímpicos. E o chef de cozinha que quer três estrelas Michelin? A artista que quer entrar nas novelas? Os políticos que não vencem eleições? A empresa que não consegue vender os seus produtos? O autor que não convence nenhum jornal a publicar as suas crónicas? O jogador que não encanta os adeptos? A juíza que não consegue estar segura da sua decisão? O advogado que não recebe nenhum caso à sua altura? A pastelaria que continua com menos fila que a da frente?
Só não sente pressão ou ansiedade com resultados quem não se põe à prova, esses admiráveis génios que optam por uma vida frugal, sem pretenderem ser necessariamente alguém. E mesmo estes, agora que penso nisso, levam com os olhares desiludidos da sociedade que impõe o sucesso, sob pena de exclusão. Por isso tantos fogem para o campo. Porque a natureza não exige nada. Mesmo quando o gado nos olha fixamente, não nos está a julgar, avalia apenas as nossas intenções, porque o último parecido connosco meteu-lhe pelas partes um braço, até ao ombro.
Sucede que apareceu uma espécie de movimento em defesa dos atletas, constituído por activistas contra a pressão que sobre eles é exercida. Retirem portanto a componente de competição. Ou inverta-se a competição. Saltou mais que os outros todos, podendo causar-lhes uma alteração de humor? Vai para último. Não saltou para não ofender ninguém? Ouro.
E assim, talvez me ocorra uma salvação para os Jogos Olímpicos, mas é preciso transformá-los em Jogos Holísticos. Para além da componente desportiva, entra muito mais em competição. O atleta sentiu-se pressionado? Alguém lhe pediu uma medalha? É perseguido por um ditador? Quis competir de gabardine e não o deixaram? Como foi a infância do atleta? Contas feitas, nos Jogos Holísticos, o bronze pode ser o novo ouro.