Sábado, Abril 20, 2024
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Injecções de moralismo

Temos um actor no estaleiro porque terá injectado cenas para ficar gostoso. Estas cenas, quando não dão barraca, devem funcionar, porque o jovem estava efectivamente nos antípodas do balofo.

Para ser franco, acho que os meus colegas gostosos exageram um pouco na forma física e passam de “grossos” – uma expressão que lamentavelmente caiu em desuso, pois era bastante ordinária – a manequins, mas não é daqueles manequins das passerelles, é daqueles das lojas, que uma pessoa dá-lhes um encontrão sem querer e eles caem tipo pedra se não lhes deitamos a mão a tempo.

A verdade é esta: À medida que os músculos crescem, a flexibilidade vai-se. Já há gajos que tentam dar um aperto de mão e nós pensamos que nos estão a apontar para os sapatos. “É o quê? Ah! Sim, olá, estás bom?”

Nisto da forma física, há claramente um meio termo. Como na cozinha, se começamos a exagerar nos ingredientes e nas misturas, o pitéu fica incomestível. Isto para não falar de quando há uma preocupação maior do chef com o empratamento do que com o produto. 

Apesar de tudo isto, o mais extraordinário nesta história ainda são as pessoas que, numa altura em que o rapaz permanece no hospital a ver se se endireita, já fazem grandes juízos sobre o que ele fez ou não. Sobre a sua responsabilidade pelo estado em que se encontra. Há muito pouca solidariedade entre pessoas. Não entre pessoas humanas, porque essas são bastante amigas. Mas as pessoas, em geral, não querem saber dos outros. 

É pouco recomendável andar a espetar coisas em lado algum para se ficar um armário – é importante passar essa mensagem – mas também não é recomendável desvalorizar uma questão de saúde desta gravidade porque a vítima se colocou naquele estado ou teve comportamentos de risco. Eles têm as costas largas, mas não tanto. E se vamos por aí…

Entre os que tomam cenas para ficar sem barriga ou para ficar com seis barriguinhas elegantes e os que tomam cenas para ficar com uma grande barriga, a responsabilidade é a mesma. Mas quando se vai parar ao hospital por abusar das gorduras e dos açúcares, já não se tem de levar com as sentenças populares e com os juízos dos cidadãos exemplares com vidas regradas que se algum dia pesarem no orçamento de Estado em matéria de Saúde só se for porque estão a doar os seus maravilhosos órgãos com 120 anos mas poucos quilómetros e sempre em autoestrada. Ainda estão na garantia. 

Claro que joga em abono destes não injectarem o cozido à portuguesa, o vinho e os doces nas nádegas. Se assim fosse, outro galo cantaria. Mas a administração não parece assim tão relevante quando a questão deve estar nas consequências.

Com algum esforço, é possível alertar para certos riscos sem desvalorizar alguém que apanhou uma infecção do arco da velha. Uma infecção que qualquer um pode apanhar, mesmo sentado ao computador a julgar comportamentos e a comer snacks salgados. Está bem que não injectou os snacks no rabo, mas havia de experimentar. Não se suja as mãos.

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