Quando se soube que a notícia de capa do Expresso, no último fim-de-semana, era falsa, o director do Imprensa Falsa escreveu imediatamente ao director daquele semanário, para manifestar a sua solidariedade.
Caro João Vieira Pereira,
Acabo de ter conhecimento do que te aconteceu. Foste dar com uma notícia falsa na tua primeira página. Nestes momentos, temos de nos unir e esquecer as guerras. Sei perfeitamente o que estás a passar, porque está-me sempre a acontecer. Sinto, por isso, que te devo uma palavra; uma palavra de solidariedade, porque mesmo assim continuam a ser apenas o segundo jornal satírico mais lido em Portugal. O primeiro ainda é o Observador. O Imprensa Falsa continua a cair na lista, por lhe reconhecerem cada vez mais credibilidade. Já me teria demitido se encontrasse alguém que ficasse à frente disto, mas pedem todos dinheiro e de momento só temos espírito de equipa.
Vi o teu pedido de desculpa. Demonstra honestidade e humildade. É notável a tua coragem para assumir que o erro é do primeiro-ministro. Eu teria feito o mesmo ou, no limite e para não estragar as relações com pessoas que podem tirar multas, tinha culpado qualquer funcionário da casa. Mas deixei-me de pedidos de desculpa por volta do centésimo. Aliás, há já uns anos que acabámos com “o Imprensa Falsa errou” e agora temos “o Imprensa Falsa acertou”. Eram mais “o Imprensa Falsa errou” do que notícias, não fazia sentido. Agora peço desculpa quando, por lapso, acertamos.
Entretanto, já percebi o que vos aconteceu. Não quiseram desconfiar dos políticos, que também é um princípio inabalável aqui nesta casa. Se está na internet ou se foi dito por um político, nós, na dúvida, publicamos logo sem ver. Caramba, se já não se pode confiar pelo menos nestas duas entidades, então não vale a pena andarmos nisto. Vendemos os nossos jornais – ou oferecemos, talvez assim o negócio seja mais célere – e vamos para assessores de imprensa.
Mas vocês foram traídos. Resta-vos o consolo de terem feito tudo como deve ser, até consultaram fontes, porque cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. E estavam certos. Nós aqui também consultamos fontes, mas costumamos ligar apenas para as mães, porque confirmam sempre tudo. Ou desmentem, consoante o que for mais favorável aos filhos. Cônjuges é um problema porque podem estar lá em guerras e já nos enganaram muitas vezes. Mas ligamos sempre para pessoas próximas, porque é a forma mais fácil de obter a confirmação de uma notícia. Estou-lhes sempre a dizer aqui “nós não precisamos de confirmar, precisamos é de confirmação”. Há casos em que, por estarmos com pouco dinheiro, sou eu a fonte e confirmo determinadas coisas. Eles escrevem na notícia “uma fonte próxima garantiu”; sou eu a fonte próxima, muitas vezes estou ao lado deles.
Mas enfim, agora é olhar para a frente. Ter só um pouco mais de cuidado. A propósito, deixa-me confidenciar-te que, entre directores de órgãos de informação, já tínhamos comentado que era muito estranho seres o único ainda com o cabelo de origem. O stress da profissão, quando a levamos a sério, não se compadece com essa farta cabeleira – “parece o Nuno Melo quando sai do banho”, comentou um de nós, não vou dizer quem porque podes não ter gostado e ainda por cima é teu colega, irmão de um ex-primeiro-ministro, não ficava bem eu dizer. Ficas a saber que eu não me ri e até disse que era só inveja. Mas reconheço que alguma calvície teria ajudado, porque assim fica aquela ideia de que estavas a fazer rolos quando estavam a fazer a notícia. E é injusto.
Com um abraço amigo.